No vasto panteão de santos da nossa Igreja, há figuras cujas vidas resplandecem como faróis de radicalidade evangélica, convidando-nos a refletir sobre nossas próprias escolhas e prioridades. Hoje, voltamos nosso olhar para São Liberato de Loro, um homem que, nascido em berço de ouro, escolheu a pobreza e a humildade, mostrando-nos onde reside a verdadeira riqueza.
A Chamada Inesperada da Graça
No coração da pitoresca Loro Piceno, na Itália do século XIII, nasceu Liberato, herdeiro de uma das mais poderosas famílias da região, os Brunforte. Desde tenra idade, o jovem Liberato estava predestinado a uma vida de privilégios, poder e vastas propriedades. No entanto, o sussurro da graça divina ecoou mais alto em seu coração do que o canto das sereias do mundo. Sua alma, profundamente devota à Santíssima Virgem Maria, clamava por algo mais puro e eterno do que as honras terrenas.
Essa inclinação espiritual, rara em seu contexto, fez com que ele percebesse que a verdadeira nobreza não estava nos títulos ou nos bens, mas na entrega total a Deus. Era um chamado que exigia coragem e uma fé inabalável, pois implicava abandonar tudo o que a sociedade lhe oferecia.
O Preço da Renúncia e a Riqueza da Alma
Para Liberato, o chamado não foi um convite a uma vida mais fácil, mas a uma entrega radical. Ele não hesitou em renunciar ao que lhe era de direito: as terras e o título de senhor de Loro Piceno, cedendo-os a seu irmão Gualtério. Uma decisão que, aos olhos do mundo, poderia parecer loucura, mas que era, na verdade, um ato de profunda sabedoria espiritual. Ao despojar-se das riquezas materiais, ele abria espaço em seu coração para o único tesouro que permanece: Deus.
Sua jornada o levou primeiro ao Convento de Rocabruna, em Urbino. Contudo, seu anseio por uma vida de penitência e oração contemplativa o impulsionou a um retiro ainda mais profundo. Foi no pequeno e ermo Convento de Sofiano, não distante do castelo de sua família, que Liberato vestiu o hábito da Ordem dos Frades Menores de São Francisco. Ali, em meio à simplicidade franciscana, sua vida floresceu em virtudes, conquistando-lhe a fama de santidade ainda em vida.
Santidade em Solidão e o Canto da Criação
A vida de Frei Liberato em Sofiano era um hino à comunhão com Deus. Relatos nos contam que ele possuía um dom extraordinário de contemplação, chegando a se elevar do chão durante suas orações, um sinal visível de sua profunda união mística com o Criador. Seu espírito, desapegado das amarras terrenas, parecia desafiar a própria gravidade.
Mas não era apenas o céu que parecia curvar-se à sua santidade; a própria criação se deleitava em sua presença. Os pássaros, atraídos pela pureza de seu coração, o acompanhavam e pousavam em seus braços, cabeça e ombros, cantando alegremente. Uma imagem que nos remete ao próprio São Francisco, e que ilustra a harmonia que surge quando o homem vive em perfeita paz com Deus e sua criação. Liberato era amigo da solidão, raramente se manifestando em palavras, mas quando o fazia, sua sabedoria angélica revelava a profundidade de sua alma. Sua vida era um testemunho de alegria serena, entregue ao trabalho humilde, à penitência silenciosa e à oração constante.
O Abraço Materno na Partida
Aos 45 anos, a virtuosa jornada terrena de Frei Liberato chegava ao fim. Gravemente enfermo, recusou-se a buscar a medicina terrena, colocando toda a sua confiança no “Médico Celestial”, Jesus Cristo, e na intercessão de sua bendita Mãe, a quem tanto amava. Foi nesse momento crucial que sua fé foi recompensada de forma milagrosa e consoladora.
A Virgem Maria, acompanhada por três santas virgens e uma multidão de anjos, visitou-o em seu leito de morte. Ao vê-la, Liberato foi tomado por uma indizível alegria e paz, suplicando que, se fosse merecedor, ela o levasse à vida eterna. Com palavras de terna maternidade, chamando-o pelo nome, Nossa Senhora o tranquilizou: “Não temas, filho, que tua oração foi ouvida, e eu vim para confortar-te antes de tua partida desta vida.” Assim, em um abraço maternal e celestial, Frei Liberato de Loro ingressou na Pátria Eterna, em uma data incerta do século XIII, mas certamente preparado pela graça.
Um Legado Reconhecido
Embora sua canonização formal tenha sido um processo longo e, como a história registra, “complicado” – só reconhecido oficialmente pelo Papa Pio IX no século XIX –, o culto a São Liberato floresceu espontaneamente muito antes. Já no século XV, o povo das terras dos Brunfortes o reverenciava como santo, construindo um novo convento e uma igreja para abrigar suas relíquias, que hoje é o Santuário de São Liberato. Essa devoção popular, que brota da experiência viva da fé e dos prodígios atribuídos ao santo, é um testemunho poderoso de sua intercessão e santidade.
Sua festa, mantida tradicionalmente em 6 de setembro, marca a solene transferência de suas relíquias para o altar-mor do Santuário, um convite perene à peregrinação e à oração, lembrando-nos que a santidade é um caminho possível e concreto.
A Mensagem de São Liberato para Nossos Dias
A vida de São Liberato de Loro é um evangelho vivido. Ela nos convida, em um mundo obcecado por posses e status, a reavaliar o que realmente importa. Sua renúncia à nobreza e às riquezas nos ensina o valor do desapego, da verdadeira liberdade que não se prende a bens materiais. Em um tempo de ruídos e distrações constantes, seu exemplo de vida contemplativa e silenciosa nos recorda a urgência de buscar momentos de solitude interior para ouvir a voz de Deus. A conexão com a natureza e a paz que irradiava mostram que a santidade harmoniza o ser humano com toda a criação.
Que a intercessão de São Liberato nos inspire a seguir o chamado de Cristo com coragem, a desapegar-nos das ilusões deste mundo e a buscar a verdadeira alegria na intimidade com Deus e na devoção à Virgem Maria. Que possamos, como ele, permitir que nossa alma, despojada de tudo, voe alto em direção ao Céu, nossa verdadeira Pátria.
São Liberato de Loro, rogai por nós!
Fonte de inspiração: Canção Nova