No vasto palco da história da salvação, há momentos em que a fé de muitos brilha com uma intensidade particular, iluminando gerações. É o caso de Santo André Dung-Lac e seus cento e dezesseis companheiros mártires, uma verdadeira constelação de santos que adornam o firmamento da Igreja. Suas vidas, ceifadas pela espada da perseguição, tornaram-se sementes férteis que deram frutos abundantes na fé católica no Vietnã e para o mundo.
O Gesto Missionário e a Semente Lançada em Solo Asiático
A chegada do Evangelho ao Vietnã, no início do século XVI, foi um ato de coragem e amor missionário. Padre Alexandre Rhodes, jesuíta francês, é lembrado como o “apóstolo” que lançou as primeiras sementes nesta terra dividida entre Tonquim, Anam e Cochinchina. Contudo, essa semente não encontrou apenas solo fértil; encontrou também ventos de oposição. A partir de 1645, a presença cristã foi marcada por uma sucessão de perseguições brutais, entremeadas por breves e frágeis períodos de paz. Mas, como bem sabemos da história da Igreja, o sangue dos mártires é semente de novos cristãos. A fé, uma vez enraizada, provaria ser inquebrantável.
André Dung-Lac: Da Humildade à Santidade
Entre esses heróis da fé, destaca-se André Dung-Lac. Nascido em Bac Ninh, em 1795, sua vida começou em meio à pobreza mais extrema, a ponto de ser confiado a um catequista católico para sua sobrevivência. Foi ali, sob a orientação amorosa e firme desse catequista, que o jovem André foi educado na fé e batizado. Uma verdadeira curiosidade espiritual reside no fato de que Deus, em Sua providência, muitas vezes se utiliza dos mais humildes instrumentos – neste caso, um catequista – para moldar futuros pilares da Igreja. Ordenado sacerdote, André serviria em Dongchuan, onde seu estilo de vida simples, sua assiduidade na assistência aos pobres e sua notável sobriedade em tudo o tornariam um pastor amado e um exemplo vivo do Evangelho.
O Chamado Irreversível ao Martírio
A vida de André foi uma jornada de crescente conformidade com Cristo. Em 1833, durante a celebração da Eucaristia, ele foi preso pela primeira vez. A comunidade, movida por grande afeto, reuniu uma alta soma para seu resgate. Neste ponto, numa tentativa de se proteger das autoridades, ele mudou seu nome de Dung para Lac. Uma curiosidade histórica e humana é ver como, mesmo nos santos, há uma prudência inicial, um instinto de autopreservação, que gradualmente cede lugar a uma coragem sobrenatural. André continuou seu ministério arriscado nas províncias mais perigosas. No final de 1839, preso pela terceira vez, junto com seu irmão Pedro, André compreendeu que o Senhor o chamava para o martírio. Com uma fé inabalável, ele recusou o pagamento de qualquer fiança, desejando que seu próprio sangue irrigasse aquela terra sofrida. Sua vida seria uma oferta total.
A Páscoa Eterna: Fidelidade até o Fim
Na dolorosa caminhada para a prisão em Hanói, André, em vez de se desesperar diante dos fiéis que choravam, os exortava a perseverar nos ensinamentos da Igreja. Já no cárcere, a cruel exigência de pisar na cruz foi respondida com um gesto de profunda adoração: ajoelharam-se e beijaram o símbolo sagrado. Não poderia haver outra sentença para tal ato de amor e fé: a decapitação. Em 21 de dezembro, na periferia de Cau-Giay, André Dung-Lac e seu irmão Pedro completaram sua Páscoa. Seu martírio não foi um fim, mas um glorioso começo, a consumação de uma vida entregue a Cristo.
A Nuvem de Testemunhas: Uma Comunhão de Santos
A perseguição no Vietnã não foi um evento isolado, mas uma era de terror. De 1645 a 1886, foram 53 editais anticristãos, que ceifaram a vida de impressionantes 113 mil fiéis. Diante de tanta firmeza na fé, a monarquia vietnamita tentou a todo custo dispersar os cristãos e confiscar seus bens, mas o espírito da Igreja se mostrava inquebrantável. Uma curiosidade devocional é a união destes mártires de diferentes origens: 96 vietnamitas, 11 espanhóis da Ordem dos Pregadores e 10 franceses das Missões Estrangeiras de Paris. Uma verdadeira sinfonia de vozes e nações, unidos no mesmo hino de louvor a Cristo. Foram necessárias várias etapas de beatificação, entre 1900 e 1951, até que, em 1986, um decreto papal unificasse todos esses grupos, culminando na canonização de 117 mártires por São João Paulo II, em 1990. Santo André Dung-Lac, provavelmente o mais conhecido, tornou-se o líder simbólico desta legião de valentes.
O Legado para Nossos Dias: Viver a Fé Sem Medo
O testemunho de Santo André Dung-Lac e seus companheiros nos desafia hoje. Em um mundo onde a fé muitas vezes é relativizada, ridicularizada ou mesmo ignorada, eles nos lembram do valor inestimável de nossa identidade cristã. Sua vida nos convida a uma reflexão profunda: estamos dispostos a viver nossa fé com a mesma integridade, simplicidade e coragem, mesmo diante de pressões e desafios? O exemplo desses mártires nos ensina a priorizar as “coisas que não passam” – o amor a Deus, a verdade do Evangelho, a salvação da alma – sobre as efêmeras seduções deste mundo. Eles nos mostram que uma comunidade unida pelo amor a Jesus é capaz dos maiores feitos, até mesmo o martírio.
Que a intercessão de Santo André Dung-Lac e seus companheiros nos fortaleça para sermos testemunhas autênticas de Cristo em nosso tempo. Que possamos, como eles, abraçar a cruz da vida com fé e esperança, certos de que a recompensa eterna nos aguarda. Sua história nos inspira a amar sem medidas e a viver a fé sem reservas.
Fonte de inspiração: Canção Nova







