A pergunta “Por que ser católico em vez de cristão?” é frequentemente dirigida aos fiéis da Igreja Católica. Por vezes, surge de uma curiosidade genuína; noutras, é um desafio direto às afirmações da fé católica. É uma questão complexa que muitos, incluindo aqueles que se tornaram católicos, ponderam profundamente em sua jornada espiritual.
É fundamental, antes de mergulhar na resposta, esclarecer um erro de categoria inerente à própria pergunta. Questionar “por que ser católico em vez de cristão” é como indagar “por que ser uma maçã em vez de uma fruta”. Parte de um pressuposto inicial de incompatibilidade entre os dois termos. Contudo, para um cristão católico, o catolicismo não é apenas uma forma de cristianismo, mas sim a sua expressão mais completa.
A Plenitude da Fé e as Denominações
Podemos pensar na fé cristã como uma vasta categoria, similar à categoria “fruta”. Jesus Cristo instituiu o que chamamos de fé cristã, com seus ensinamentos e sua vida. No entanto, ao longo da história, surgiram diversas denominações: batistas, anglicanos, presbiterianos, pentecostais, metodistas, entre muitas outras. Cada uma delas representa uma “espécie” dentro do “gênero” cristianismo, assim como maçãs, laranjas e bananas são espécies de frutas.
Cada denominação, em alguma medida, reflete um aspecto da verdadeira natureza da fé cristã revelada por Jesus. Elas comunicam algo sobre o que é o cristianismo, mas talvez não a totalidade. Muitos tendem a ver o catolicismo como apenas mais uma dessas espécies, uma denominação entre tantas. Contudo, a Igreja Católica se define de forma diferente: como o todo do qual todas as outras, na medida em que são verdadeiras, retratam apenas uma parte.
Imagine uma inteligência artificial infalível, capaz de responder a qualquer pergunta com certeza absoluta. Ao ser consultada, pessoas com ideologias preexistentes esperariam ver suas crenças confirmadas. Republicanos encontrariam apoio para o livre mercado, democratas para suas políticas sociais, e assim por diante. Essa IA revelaria que porções da verdade podem ser encontradas em diversos sistemas, mas nunca são totalmente resumidas por nenhum deles em particular.
O mesmo ocorre com a verdade da fé. A verdade é vasta demais para ser confinada em fronteiras rígidas, reduzida a uma porção “fácil de digerir” ou a um slogan, como “fé somente”. As heresias, historicamente, foram tentativas de reduzir a complexidade da verdade a algo mais simples. Como observou G.K. Chesterton, “o poeta só pede para enfiar a cabeça nos céus; é o lógico que procura enfiar os céus em sua cabeça, e é a cabeça dele que se parte”.
As Marcas da Igreja e a Autoridade Apostólica
O termo “católico” é antigo na história cristã, cunhado por Santo Inácio de Antioquia, discípulo direto de São João Apóstolo. Inácio descreveu a verdadeira Igreja Católica como aquela onde o bispo está presente, enfatizando a importância de uma liderança episcopal com pedigree apostólico para a plenitude da fé. A palavra “católico” significa “universal” ou, mais precisamente, “segundo o todo”, indicando uma igreja que preserva todas as doutrinas e mistérios, sem deixar nada de fora para facilitar a digestão.
Isso nos leva às quatro marcas da Igreja, articuladas no Credo Niceno: Una, Santa, Católica e Apostólica. A Igreja Católica as incorpora plenamente:
- Una: Orientada para a unidade, como na oração de Cristo em João 17. Denominações que se dividem constantemente não manifestam essa unidade.
- Santa: Separada do mundo, peculiarmente sagrada, e não meramente relevante para se encaixar nos moldes seculares.
- Católica (Universal): Presente em todas as nações e pregando a totalidade da fé, transcendendo qualquer cultura ou nação específica.
- Apostólica: Mantém a autoridade transmitida pelos apóstolos, uma autoridade que a maioria das denominações nem sequer reconhece existir.
A Questão da Autoridade: Bíblia ou Igreja?
A pergunta fundamental para todo cristão é: como sabemos o que a fé cristã realmente é? Quais doutrinas e práticas são admissíveis? Jesus nos deu autoridade para decidir, ou nos colocou sob uma autoridade específica? Quase todos os cristãos concordam que foi a última opção.
Na tradição protestante, a resposta geralmente é “a Escritura é a autoridade”. Contudo, nas igrejas apostólicas (como a Ortodoxa ou a Católica), a autoridade é atribuída tanto à Escritura quanto à Tradição Apostólica e ao Magistério da Igreja. A Bíblia nunca se autodenomina a única ou a mais alta autoridade. Ela fala da Escritura como revelação escrita, mas nunca da “Bíblia” como um cânon fechado.
O próprio cânon da Escritura – a lista de livros que consideramos bíblicos – não está na Bíblia. É uma doutrina da Igreja que estabelece quais livros são inspirados. Isso significa que, para ter uma Bíblia, é preciso aceitar uma doutrina infalível da Igreja não encontrada na própria Escritura. Isso revela um “intermediário” entre o crente e sua autoridade supostamente suprema: a Igreja Católica.
Jesus concedeu à Igreja, em particular a Pedro, uma autoridade para “ligar e desligar” na Terra e no Céu (Mateus 16:19), e a autoridade para perdoar pecados (João 20:23). Ele também concedeu a autoridade para escrever novas escrituras. A escrita infalível das Escrituras pelos apóstolos demonstra que Deus pode usar seres humanos para serem Sua “boca” e preservá-los do erro. Por que essa autoridade infalível deixaria de existir após a primeira geração da Igreja?
Deus estabeleceria uma autoridade viva, capaz de sempre esclarecer interpretações e resolver novas controvérsias, ou um texto fechado que a Igreja teria que interpretar por milênios? A unidade da Igreja, pela qual Jesus orou em João 17, é muito mais bem servida por uma autoridade viva e transmitida de geração em geração. A história da Igreja confirma essa autoridade, com Padres da Igreja como Inácio de Antioquia, Irineu e Cipriano de Cartago reconhecendo a autoridade dos bispos e o primado de Pedro.
Quando se compreende a autoridade infalível da Igreja para ensinar e estabelecer doutrinas, muitas objeções comuns, como “onde está a Imaculada Conceição na Bíblia?”, tornam-se redundantes. A pergunta passa a ser: “onde a Igreja ensina isso?” Documentos como a Didachê, um dos escritos não canônicos mais antigos, descrevem uma Igreja hierárquica com bispos, padres e diáconos, e sacramentos como o Batismo e a Eucaristia, confirmando práticas que a Igreja Católica mantém até hoje.