A passagem de Mateus 16:17-19 é central para a compreensão do papel de Pedro na fundação da Igreja:
“E Jesus, respondendo, disse-lhe: Bem-aventurado és tu, Simão Barjonas, porque não foi carne e sangue que to revelou, mas meu Pai, que está nos céus. Pois também eu te digo que tu és Pedro, e sobre esta pedra edificarei a minha igreja, e as portas do inferno não prevalecerão contra ela; e eu te darei as chaves do reino dos céus; e tudo o que ligares na terra será ligado nos céus, e tudo o que desligares na terra será desligado nos céus.”
Essa é a base para a crença de que Pedro é a rocha, mas a controvérsia surge da interpretação das palavras gregas. Alegam que petros (referindo-se a Pedro) significa uma pedra pequena e insignificante, enquanto petra (a rocha sobre a qual a Igreja seria construída) denotaria uma rocha maciça, sendo esta Jesus ou a confissão de fé de Pedro. Contudo, essa distinção não se sustenta diante de uma análise mais detalhada.
1. O Original Aramaico: Onde Não Há Distinção de “Rochas”
A evidência mais sólida de que Pedro é a rocha reside na língua original em que Mateus provavelmente foi escrito: o aramaico. Padres da Igreja do segundo século, como Papías e Irineu, afirmam que Mateus foi escrito em aramaico. Mais crucialmente, Jesus teria falado em aramaico, a língua comum dos judeus da época.
João 1:42 oferece uma prova bíblica adicional do uso do aramaico na nomeação de Pedro: “[André] levou-o a Jesus. Jesus olhou para ele e disse: ‘Tu és Simão, filho de João? Tu serás chamado Cefas’ (que significa Pedro).” O nome Cefas é a forma anglicizada do aramaico Kepha, que simplesmente significa “rocha“. No original aramaico, não haveria distinção entre uma “pequena rocha” e uma “grande rocha”. Eruditos protestantes renomados, como D.A. Carson, concordam que o aramaico subjacente é inquestionável, e que kepha teria sido usado em ambas as cláusulas (“tu és kepha” e “nesta kepha”), pois a palavra era usada tanto para nome quanto para “rocha“. A Peshitta, uma tradução da Bíblia para o siríaco (língua cognata ao aramaico), não faz distinção entre as palavras nas duas cláusulas.
A Voz de Jesus no Coração do Povo: A Língua do Amor
Imagine Jesus, caminhando entre o povo simples da Galileia, falando na língua que eles entendiam e amavam: o aramaico. Não era grego, que era a língua dos comerciantes e do império romano. Era a língua do dia a dia, das famílias. Quando Jesus olhou para Simão e o chamou de “Cefas”, ele estava usando uma palavra aramaica, Kepha, que significa simplesmente “rocha“. Sem rodeios, sem duplos sentidos. Não havia uma “rocha pequena” e uma “rocha grande” nessa palavra. Era tudo uma coisa só. É como se Jesus dissesse: “Você é Rocha, e sobre essa Rocha (que é você) construirei Minha Igreja.” Pense nos estudiosos mais sérios, até mesmo entre aqueles que não seguem a fé católica, eles concordam: no aramaico, não há essa distinção. É a linguagem do amor e da clareza, nos mostrando que Pedro é a rocha.
2. Koine Grego: Uma Raiz, Uma Definição
Mesmo no grego koiné, o dialeto do grego usado pelos autores do Novo Testamento, petros e petra são formas masculinas e femininas de palavras com a mesma raiz e a mesma definição: rocha. Não há uma “pequena rocha” no texto grego para Pedro.
A razão para o uso dessas duas palavras por Mateus é simples: petra era a palavra comum para “rocha” em grego, utilizada quinze vezes no Novo Testamento. Petros, por outro lado, era um termo grego antigo não comumente usado no koiné, exceto para o nome de Pedro depois que Jesus mudou o nome de Simão para Pedro. Ao traduzir, Mateus usaria petra para “rocha“. No entanto, petra é um substantivo feminino. Seria impróprio chamar um homem de Petra. Assim, petros foi usado para o nome de Pedro para adequá-lo ao gênero masculino.
O Grego e o Carinho Pelos Nomes: Uma Questão de Gênero, Não de Grandeza
Agora, vamos pensar no grego, a língua em que o Evangelho de Mateus foi escrito para chegar a mais pessoas. Existem duas palavras: petros e petra. À primeira vista, pode parecer uma distinção. Mas não é! É uma questão de gênero, como quando dizemos “o gato” e “a gata”. Petra era a palavra comum para “rocha”, mas ela é feminina. E seria muito estranho chamar um homem como Pedro de “A Rocha” no feminino, não é? Seria como chamar um homem forte de “Valéria”. Por isso, usaram petros, que é a forma masculina da mesma palavra que significa “rocha“. É um toque de carinho e respeito pela gramática, confirmando que Pedro é a rocha sem diminuir sua importância.
3. Intercambialidade de Termos e o Consenso Erudito
Os autores inspirados poderiam ter usado várias palavras em grego para “rocha” ou “pedra” ao nomear Pedro, como petra e lithos. Ambas podiam ser usadas de forma intercambiável, e a conotação de “grande” ou “pequeno” dependeria do contexto. As palavras significavam simplesmente “rocha” ou “pedra“.
Craig S. Keener, outro estudioso protestante, afirma em seu comentário bíblico que no grego da época, petros e petra eram termos cognatos usados de forma intercambiável. D.A. Carson aponta que a distinção entre grande e pequeno existia no grego antigo (séculos VIII a IV a.C.), mas era em grande parte confinada à poesia, não ao grego koiné do Novo Testamento.
Dr. Oscar Cullman, editor contribuinte do respeitado dicionário grego Theological Dictionary of the New Testament, declara sem rodeios sobre Mateus 16:18 que “o óbvio jogo de palavras que entrou no texto grego… sugere uma identidade material entre petra e Petros… sendo impossível diferenciar estritamente entre as duas palavras… Petros é esta petra, não apenas sua fé ou sua confissão… A ideia dos Reformadores de que ele se refere à fé de Pedro é bastante inconcebível… Pois não há referência aqui à fé de Pedro. Em vez disso, o paralelismo de ‘tu és Rocha’ e ‘sobre esta rocha edificarei’ mostra que a segunda rocha só pode ser a mesma que a primeira. É, portanto, evidente que Jesus está se referindo a Pedro, a quem ele deu o nome de Rocha… Nesse sentido, a exegese católica romana está correta e todas as tentativas protestantes de escapar a essa interpretação devem ser rejeitadas.” Essa é uma admissão poderosa da identidade de Pedro como a rocha.
Todos os Caminhos Levam à Mesma Rocha: O Consenso Que Aquece o Coração
Pense na infinidade de palavras que Mateus poderia ter usado para “pedra” ou “rocha” se quisesse criar alguma dúvida sobre Pedro. Mas ele não o fez. Ele usou palavras que, para quem falava grego na época de Jesus (o grego koiné), eram sinônimas. E o que é mais emocionante? Grandes estudiosos, inclusive protestantes, concordam que não há distinção. Um deles, Dr. Oscar Cullman, disse com uma honestidade que toca a alma: “É impossível diferenciar estritamente entre as duas palavras… Pedro é esta petra, não apenas sua fé ou sua confissão… A ideia dos Reformadores de que ele se refere à fé de Pedro é bastante inconcebível… Todas as tentativas protestantes de escapar a essa interpretação devem ser rejeitadas.” Isso mostra que o coração da verdade é simples: Pedro é a rocha, e essa é uma convicção que nos une.
4. A Escolha de Palavras de Mateus: Se Houvesse Distinção, Seria Outra Palavra
Se Mateus quisesse distinguir entre “rochas” no texto, ele provavelmente teria usado lithos, que, embora pudesse se referir a uma rocha grande, era mais comumente usada para denotar uma pedra pequena. No entanto, existe uma terceira palavra que Mateus poderia ter usado que sempre significa “pedra pequena”: psephos. Ela é usada em Apocalipse 2:17 para se referir a uma “pequena pedra” ou “seixo“. O fato de Mateus não ter utilizado lithos ou psephos para Pedro reforça a ideia de que a distinção de tamanho não estava em sua intenção.
Se a Diferença Importasse, Jesus Teria Sido Mais Claro: A Simplicidade da Escolha Divina
Se Jesus quisesse dizer que Pedro era uma pedrinha e a Igreja seria construída em outra rocha, maior, ele tinha palavras muito claras para isso! Por exemplo, existia a palavra psephos, que significa uma pedrinha, um seixo. Mas Jesus não a usou. Ele escolheu as palavras que mostram que Pedro é a rocha, sem rodeios. É como um Pai que fala diretamente com Seu filho, sem meias palavras, deixando claro seu propósito e seu amor. A escolha das palavras de Jesus nos mostra a intencionalidade divina em fazer de Pedro a rocha fundamental.
5. O Contexto Imediato: Autoridade Única Concedida a Pedro
Uma linha de raciocínio mais simples, que se afasta das linguagens originais, examina o contexto imediato da passagem. Jesus usa o pronome pessoal na segunda pessoa sete vezes em apenas três versículos ao se dirigir a Pedro:
“E Jesus, respondendo, disse-lhe: Bem-aventurado és tu, Simão Barjonas, porque não foi carne e sangue que to revelou, mas meu Pai, que está nos céus. Pois também eu te digo que tu és Pedro, e sobre esta pedra edificarei a minha igreja, e as portas do inferno não prevalecerão contra ela; e eu te darei as chaves do reino dos céus; e tudo o que tu ligares na terra será ligado nos céus, e tudo o que tu desligares na terra será desligado nos céus.”
O contexto é claramente um de Jesus comunicando uma autoridade única a Pedro. Além disso, Jesus é retratado como o construtor da Igreja, não o edifício. Ele diz: “Edificarei a minha igreja.” Jesus é “o homem sábio que edificou sua casa sobre a rocha” (Mateus 7:24). Não se encaixa no contexto que Jesus estivesse edificando a Igreja sobre si mesmo; ele a está edificando sobre Pedro, fazendo de Pedro a rocha.
Uma Conversa Direta, Um Presente Pessoal: O Diálogo do Coração
Às vezes, a melhor forma de entender é ouvir o tom da conversa. Em Mateus 16, Jesus está falando diretamente com Pedro. Ele usa o pronome “tu” sete vezes em apenas três versículos! É um diálogo íntimo, um presente pessoal de autoridade. Jesus não diz: “Sobre uma rocha distante edificarei”, mas sim: “tu és Pedro, e sobre esta pedra (que é você) edificarei a minha Igreja.” Ele é o construtor, sim, mas ele constrói sobre Pedro. É como um artista que escolhe a base perfeita para sua obra-prima. Esse carinho na forma de se expressar reforça a verdade: Pedro é a rocha pessoalmente escolhida por Jesus.
6. A Significância da Mudança de Nome de Simão para Pedro
A mudança de nome de Simão para Pedro é de grande significado. Quando Deus revelou um chamado novo e radical a certas pessoas na Escritura, ele às vezes mudava seus nomes. Abraão (“pai exaltado” em hebraico) foi mudado para Abraão (“pai de multidões”), e Jacó (“suplantador”) para Israel (“aquele que prevalece com Deus”).
Existe um paralelo interessante entre Abraão e Pedro. Em Isaías 51:1-2, lemos: “Ouvi-me, vós que seguis a justiça, que buscais ao Senhor; olhai para a rocha de que fostes cortados… Olhai para Abraão, vosso pai.” Jesus faz de Pedro um verdadeiro “pai” sobre a casa da fé, assim como Deus fez de Abraão nosso verdadeiro “pai” na Fé (Romanos 4:1-18, Tiago 2:21). Assim, é apropriado que os sucessores de Pedro sejam chamados de “papa” ou “pai”, assim como Abraão (Lucas 16:24), reforçando a ideia de que Pedro é a rocha fundacional dessa paternidade espiritual.
A Mudança de Nome: Uma Nova Missão, Um Novo Legado de Amor
Quando Deus dá um novo nome a alguém na Bíblia, é sempre para uma missão especial, uma nova jornada de fé. Pense em Abrão, que se tornou Abraão, o “pai de muitas nações”. Da mesma forma, Simão, o pescador, recebe o nome de Pedro, a “rocha“. Há um paralelo lindo aqui: assim como Abraão é o “pai da fé”, Pedro se torna um “pai” para a família da Igreja. É por isso que os sucessores de Pedro são chamados de “Papa”, que significa “pai”. É um elo de amor e continuidade, mostrando que a identidade de Pedro como a rocha é parte de um plano divino de paternidade espiritual.
7. Pedro como o “Primeiro-Ministro” do Reino Messiânico
Quando compreendemos que Cristo é o verdadeiro “filho de Davi” que veio para restaurar o reino profético de Davi, entendemos que Cristo em Mateus 16, como o rei de Israel, estava estabelecendo um “primeiro-ministro” entre seus ministros – os apóstolos – no reino. Isaías 22:15-22 nos dá uma visão do ministério do “primeiro-ministro” no antigo Israel:
“Assim diz o Senhor Deus dos Exércitos: Vai, entra a este tesoureiro, a Sebna, o que está sobre a casa, e dize-lhe… eis que o Senhor te arremessará violentamente… e te derrubará do teu posto, e da tua estação te arrancará. E naquele dia chamarei a meu servo Eliaquim, filho de Hilquias; e o vestirei da tua túnica, e o cingirei com o teu cinto, e entregarei em sua mão o teu poder; e ele será um pai para os moradores de Jerusalém e para a casa de Judá. E porei a chave da casa de Davi sobre o seu ombro; ele abrirá, e ninguém fechará; e fechará, e ninguém abrirá.”
Em Apocalipse 1:18, Jesus declara: “Eu tenho as chaves da morte e do Hades.” Ele então cita este mesmo texto de Isaías em Apocalipse 3:7: “E ao anjo da igreja que está em Filadélfia escreve: Isto diz o Santo, o Verdadeiro, o que tem a chave de Davi, o que abre, e ninguém fecha; e fecha, e ninguém abre.”
Nenhum cristão negaria que Jesus é o rei que possui as chaves. A quem ele entrega as chaves? A Pedro! Essa concessão de chaves é um ato de delegação de autoridade, posicionando Pedro como o “primeiro-ministro” do reino, com autoridade para “ligar e desligar”, solidificando a argumentação de que Pedro é a rocha sobre a qual a Igreja foi estabelecida.
As Chaves do Reino: Um Sinal de Confiança e Liderança Afetuosa
Imagine um rei que confia as chaves de seu palácio ao seu ministro mais leal. É um sinal de tremenda confiança e autoridade! Jesus, o verdadeiro “filho de Davi”, o Rei do novo Reino, entrega a Pedro as chaves do Reino dos Céus. É como o “primeiro-ministro” do rei, com poder para “abrir e fechar”, “ligar e desligar”. Ninguém negaria que Jesus é o Rei que possui as chaves. Mas a quem Ele as entrega? A Pedro! Isso não o torna igual a Jesus, mas sim seu representante amoroso, aquele em quem Jesus confia para guiar e cuidar de Seu povo. Essa imagem de confiança e entrega nos mostra, de forma inegável, que Pedro é a rocha e o guardião das chaves do Reino.
A vasta evidência linguística, contextual e teológica aponta inequivocamente para a conclusão de que Pedro é a rocha sobre a qual Jesus prometeu edificar sua Igreja. As tentativas de desqualificar Pedro como essa rocha baseadas em distinções semânticas inexistentes no grego ou no aramaico, ou em interpretações que ignoram o contexto da concessão de autoridade, não resistem a um escrutínio cuidadoso. A mudança de nome, a concessão das chaves e o paralelismo com a função do “primeiro-ministro” davídico reforçam a singularidade do papel de Pedro como fundamento visível da Igreja de Cristo.
Que essas reflexões, com uma linguagem mais próxima do coração, reforcem a sua fé e a sua compreensão sobre o papel inquestionável de Pedro como a rocha escolhida por Jesus para edificar a Sua Igreja. Não é apenas uma questão teológica complexa, mas uma verdade que revela o cuidado e a sabedoria divina em estabelecer um fundamento sólido para a nossa fé.